Em audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) realizada nesta quarta-feira (13), representantes dos setores imobiliário, de turismo e lazer, de sociedades anônimas do futebol, de cooperativas e de reciclagem pediram que os tributos que serão implementados na reforma tributária não aumentem a carga tributária. Esses setores, que contam com o chamado regime diferenciado e possuem alíquotas reduzidas, estão sendo ouvidos pela CCJ de acordo com plano de trabalho do senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator do PLP 68/2024. O projeto implementa os tributos previstos na reforma: Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), Contribuição sobre Bens e Seviços (CBS) e Imposto Seletivo (IS), que substituirão alguns tributos existentes atualmente, como ICMS, ISS, PIS e Cofins.
Aluguel de imóveis
Para o senador Carlos Portinho (PL-RJ), um dos setores mais importantes representados no debate é o imobiliário, por seu impacto social, uma vez que é o que mais emprega em toda a cadeia, desde a construção até a contratação de diferentes categorias de profissionais.
Pedro Henrique Lima, vice-presidente de Assuntos Legislativos do Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci-Creci), sugeriu mudanças no projeto para que locadores não tenham que arcar com tributos diante de eventual inadimplência de locatários (inquilinos). Ele também defendeu a ampliação do fator redutor da alíquota para o mercado imobiliário, dos 40% previstos para 60%, até 80%, de forma que o consumidor final não seja prejudicado pelo aumento da carga tributária.
— Esse aumento com certeza será jogado para o consumidor. São 47 milhões de brasileiros que moram em habitações alugadas. Cerca de metade dos que alugam imóvel já gasta mais do que 30% da renda com aluguel. Se ampliarmos mais ainda, teremos com certeza um impacto negativo e muitas pessoas ficarão inadimplentes ou terão que procurar outra maneira de alugar ou até mesmo comprar um imóvel — argumentou.
Eduardo Braga concordou que a indústria da construção é fator de geração de emprego e de renda, mas fez uma ressalva quanto à diferença que se deve considerar conforme o padrão da moradia.
— É preciso que nós tenhamos consciência de que existem habitações populares que precisam ser tratadas com determinado tratamento tributário. Mas existem habitações que não são populares e que podem ser tratadas com [outro] determinado tratamento tributário, a fim de que a gente não cometa a injustiça tributária na área da construção civil.
Futebol
O senador Carlos Portinho também afirmou que, da maneira como está, a reforma tributária vai desestimular o pagamento de impostos pelos clubes brasileiros de futebol. Ele relembrou a aprovação da lei sobre a Sociedade Anônima do Futebol (SAF), que estimulou investimentos estrangeiros em clubes nacionais que eram associações e viraram empresas, causando um aumento exponencial na arrecadação de impostos no setor (Lei 14.193, de 2021) .
— A gente não pode parar esse processo, que está sendo muito positivo, de estimular que clubes associativos se transformem num modelo empresarial da SAF. E se a gente sobrecarrega no imposto as sociedades anônimas de futebol, e mantém os clubes com uma tributação baixa, os clubes associativos, que é o que está acontecendo, a gente não vai incentivar essa transição — argumentou Portinho.
Além de criar as SAFs, a legislação previu a Tributação Específica do Futebol (TEF), reunindo os tributos federais. A tributarista Maria Juliana Fonseca, consultora da sociedade anônima do Atlético Mineiro, apontou que a reforma tributária, além de cobrar a TEF em 4%, ainda prevê a cobrança de 1,5% de Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).
— É uma impropriedade. Por que nós temos 1,5% de CBS? Vamos recordar: a CBS veio para substituir tributo federal, PIS e Cofins. Se a TEF reúne todos os tributos federais — já era assim na lei da sociedade anônima e é assim na reforma —, por que nós temos 4% de todos os tributos federais mais 1,5% de CBS? — questionou.
A consultora acrescentou ainda que o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) substitui o ICMS e o ISS, com alíquota de 3%, mas ela defende que passe a ser de 1%.
— 3% em cima do todo é muito, mas muito mais do que se recolhe eventualmente de ICMS ou ISS. Então, nós tínhamos uma tributação de 4% que está indo para uma tributação de 8,5% — protestou.
Rodrigo Rocha de Castro, presidente do Instituto Brasileiro de Estudos e Desenvolvimento da SAF (Ibesaf), afirmou que o futebol tem 150 milhões de torcedores no país. Ainda assim, segundo ele, antes o setor só criava passivos tributários e judiciais, representando um peso social.
— O futebol é o maior instrumento de soft power do país. Assim como os americanos fizeram com o cinema, os sul-coreanos com a música pop, o nosso futebol é uma atividade que está na televisão de 5 bilhões de pessoas e nós podemos usar isso para influenciar o mundo — observou.
Turismo e lazer
Outro setor representado na reunião foi o de turismo e lazer. O consultor tributário da Associação Brasileira de Resorts (Resorts Brasil) apresentou dados segundo os quais países com alguns dos maiores destinos turísticos do mundo oferecem alíquota reduzida para a hotelaria. De acordo com a pesquisa apresentada, 28 de 32 países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) analisados têm alíquotas reduzidas para o setor. Desses, 20 têm alíquotas inferiores a 50% da alíquota padrão.
— Por que esse comportamento existe? Porque o setor é importante? Sim, sabemos que é um setor que gera bastante emprego. Mas além disso tem uma questão técnica (…) guerra fiscal. Por isso que a gente tem essa justificativa bem clara do porquê esses países têm alíquotas inferiores, mesmo sendo países dos principais destinos de turismo do mundo. Porque existe uma concorrência muito grande, que se faz porque a tributação é no destino.
Manoel Cardoso Linhares, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (Abih), ressaltou que o turismo não é apenas lazer. Segundo ele, o segmento representa 8% do PIB e sustenta mais de 6,8 milhões de empregos no país. Linhares afirmou que os efeitos da reforma tributária poderão ser profundamente negativos para o futuro do segmento.
— Esse futuro está em risco. Um estudo solicitado por nove associações do setor apresentou um dado alarmante. A cada 1% de aumento no preço do serviço do turismo, a demanda pode cair 0,7%. O que significa isso? Qualquer alta de custo pode fazer com que os brasileiros e estrangeiros escolham explorar novas belezas. Esse impacto reflete em menos turistas, menos receita, menos investimento e, acima de tudo, menos emprego — lamentou.
O economista Thiago Xavier, representando o Sistema Integrado de Parques & Atrações Turísticas (Sindepat), também enfatizou que o aumento no preço dos serviços no turismo trará consequências negativas para o setor.
Já o presidente-executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci Júnior, pediu que as gorjetas recebidas pelos trabalhadores e que as taxas cobradas pelos entregadores não entrem no cálculo dos impostos.
Cooperativas
A coordenadora tributária da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB), Amanda Rezende, afirmou que existem mais de 4,5 mil cooperativas no país, com 23,4 milhões de cooperados, ou 11% da população brasileira. De acordo com a coordenadora, elas atuam em diversas categorias, como docência, reciclagem e artesanato. A representante da OCB pediu que fosse preservado o texto negociado na Câmara dos Deputados, para garantir a sobrevivência do cooperativismo no país. Caso contrário, segundo Amanda, ele não teria sustentação.
Balança
O subsecretário de Tributação e Contencioso da Receita Federal, Fernando Mombelli, defendeu a relevância da neutralidade tributária, sem aumento nem redução de alíquota nos entes federados (federal, estadual e municipal) e defendeu a transparência, mas lembrou que o número de regimes diferenciados impacta na alíquota padrão. Segundo Mombelli, o IVA (imposto sobre valor agregado, que reúne a IBS e a CBS) previsto na reforma tributária teria padrão “europeu”, mas que as “conquistas” dos setores para a inclusão nesses regimes especiais elevou a alíquota geral para 26,5% até 28%.
— Se não tivéssemos alíquotas diferenciadas nem créditos presumidos, por hipóteses apenas, nós teríamos a previsão aí uma alíquota modal de 21% para nosso IVA. Ou seja, alíquota unica, crédito amplo, sem maiores discriminações.
por Agência Senado
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